segunda-feira, 14 de junho de 2010

VÍDEO - O PEIDO - AV2

O vídeo em questão, “O Peido”, retrata uma cena na qual uma distinta senhora, muito bem vestida, aparentemente burguesa, senta e degusta elegantemente seu chá em um ambiente sofisticado. O telespectador observa essa cena durante 1 minuto, até que para sua surpresa, ela discretamente deixa escapar um sonoro “pum”. O que poderia ser motivo de riso, é usado como ponto de partida para o desenvolvimento desse trabalho acadêmico. O peido, conforme apresentado no vídeo, rompe com a ordem e, por conseguinte, com padrões esperados de comportamento.
O vídeo, portanto, faz um sutil contraste entre Modernidade e Pós-Modernidade. Ele alerta para a decadência da sociedade moderna e a instauração da Pós-Modernidade, contrapondo os costumes clássicos da alta cultura europeia com as novas manifestações artísticas, que têm como objetivo mostrar o mundo real e estranho, diferente do mundo perfeito e utópico representado pela arte clássica. A partir desse vídeo, pode-se fazer uma co-relação entre esses dois períodos históricos e como os ideais contidos em cada um afetam a vida dos indivíduos que vivem nas sociedades pós-industriais.
A sociedade industrial moderna surgiu a partir da máquina, de artigos produzidos em série e padronizados, e caminhou rumo ao progresso seguindo os passos do projeto Iluminista que pregava o desenvolvimento material e moral do homem através do conhecimento. Para Bauman (1999), a Modernidade teve seus fundamentos baseados na ordem, onde tudo deveria ser ordenado e controlado. O Estado moderno buscou conhecimentos técnico-científicos para organizar e assim poder controlar os povos, construindo o que se achava ser uma vida melhor, ideal. Os valores e instituições eram delineados, sólidos e racionalmente planejados: família, trabalho, escola, igreja, política. As utopias modernas retratam um mundo perfeito, “transparente – em que nada de obscuro ou impenetrável se colocava no caminho do olhar; um mundo em que nada estragasse a harmonia; nada “fora do lugar”: um mundo sem “sujeira”; um mundo sem estranhos”. (BAUMAN, 1998 p. 21)
Como parte de um processo de transformação, veio a ruptura com a Modernidade e o início da Pós-Modernidade, trazendo em si mudanças de costumes e valores. O mundo moderno, de certezas, passou a ser substituído por uma cultura de indeterminações e incertezas. Ao contrário da sociedade moderna, o mundo atual pós-moderno enxerga o que está fora do lugar e tenta mostrar aquilo que a sociedade tentou esconder e nunca quis tomar conhecimento. É criado um movimento onde o que era marginalizado no passado, hoje é trazido ao centro, possibilitando aos integrantes de uma sociedade transitar entre os meios. Nesse novo conceito de mundo, surge uma inquietação com as miudezas cotidianas, com o estranho e feio do dia-a-dia, com tudo aquilo que é marginal.
Pensando na arte como manifestação cultural, é justamente esse descentramento que abre caminho para novos espaços de contestação, causando uma importantíssima mudança nas relações culturais populares, cada vez mais mutáveis. Com isso, há um esvaziamento da estética e não existem mais padrões limitados para representar a realidade: o banal, o sujo, o feio, o cotidiano, o que está nas ruas, viram matéria-prima na mão do artista. É a “desestetização” da arte clássica: ela abandona a ordem, a beleza, a forma, o valor ao supremo e eterno e ataca a própria definição, utilizando matérias do cotidiano e abandonando o convencional. O objetivo artístico é trazer à tona as profundas mudanças sociais e culturais, sendo a melhor forma de denunciá-las, esfregar na cara da sociedade a precariedade em que ela se encontra. A cultura popular pós-moderna parte de imagens despercebidas no cotidiano, assim como a miséria e a sujeira, para formar composições que permitam que espectador, acostumado a apenas absorver ideias e valores, passe da contemplação à ação e se transforme em fruidor, questionando aquilo que é banalizado. Questionar, então, é “desbanalizar” o banal.
Para Hall (2009), a distinção entre erudito e popular é precisamente o que o pós-moderno global está deslocando. Sendo assim, a arte abandona museus, galerias e teatros e é lançada às ruas com outra linguagem, assimilável pela massa, que passa a dar valor à arte “banal” cotidiana. O Pós-Modernismo, segundo Siqueira (2002), “não limita-se às áreas de literatura, arquitetura e artes plásticas, mas é uma realidade genuinamente histórica e socioeconômica”, pois só ele é capaz de representar uma mudança cultural rumo ao popular. Segundo Hall (2009), é através do Pós-Modernismo que se dá o descentramento das antigas hierarquias, abrindo caminho para novos espaços de contestação, ele se faz presente nas instituições, nas relações humanas, nas ruas, nos bares, na mídia de massa, na roupa colorida, nos cabelos, na pele, na música, nas tribos. Várias tendências e estilos são misturados sob o mesmo nome; ele é plural, aberto e líquido, flutuando no que não se pode decidir. Alan (2008, apud BAUMAN), sobre isso diz:
Para a grande maioria dos habitantes do líquido mundo moderno, atitudes como cuidar da coesão, apegar-se às regras, agir de acordo com precedentes e manter-se fiel à lógica da continuidade, em vez de flutuar na onda das oportunidades mutáveis e de curta duração, não constituem opções promissoras.
Há, nessa nova cultura, uma ruptura de barreiras e fronteiras, uma oposição ao clássico, à regra, à ordem, ao progresso, à verdade, à centralização, à referencialização e tantos outros valores gerados pelo sonho positivista. No entanto, a pluralidade pós-moderna traz marcas negativas. Segundo Santos (2000), no Pós-Modernismo o coerente é ser incoerente, pois o indivíduo se encontra fragmentado, inserido em um contexto onde caos e ordem se misturam. A vida no ambiente pós-moderno é um show constante, o sujeito é bombardeado o tempo todo com informações parcelares que nunca formam um todo, mas que causam importantes efeitos culturais, sociais e políticos. Diante dessa nova realidade, Bauman (2001) acredita que a solidez das instituições sociais acabou se liquificando e tornando-as não mais sólidas e inabaláveis. O mesmo Positivismo que levou a humanidade ao desenvolvimento tecnológico construindo a máquina para servir ao homem moderno, transformou esse homem também em máquina para servir ao capitalismo, o que resultou em um afastamento daquilo que é essencial ao ser humano, como valores e morais. Como consequência, o mundo pós-moderno carrega a dissolução de laços afetivos e sociais, onde os indivíduos vivem um tempo de desapego, de individualização e de indiferença em relação aos valores coletivos. O homem, por estar no centro de um mundo confuso e plural em linguagens e culturas, não possui um referencial substancial, apresentando assim dificuldade em criar sua identidade e suas representações sociais diante de tamanha contradição.
A partir desse cenário atual da humanidade, se busca compreender o real papel da Educação enquanto agente transformador e ao mesmo tempo propulsor de um espaço para reflexão desse novo indivíduo nessa nova sociedade. Segundo Filho (2008 apud ARENDT), “a essência da Educação é a natalidade, o fato de que seres nascem para o mundo”, no entanto a grande dificuldade no Pós-Modernismo é justamente introduzir esse novo indivíduo nesse novo mundo que se apresenta individualista e em crise. A escola, assim como as demais instituições, está em fase de transição e de entendimento de si mesma e de sua função perante o novo contexto social. Sua estrutura ainda está, de certa forma, pautada nos antigos fundamentos modernistas, o que dificulta sua adaptação às necessidades da sociedade pós-moderna.
A Educação, na sociedade moderna, era entendida por seu papel “socializador”, pois através dela eram constituídos e mantidos os sistemas sociais, pois sem a socialização, o sistema não era capaz de se manter integrado e de preservar sua ordem e equilíbrio. Para os pensadores modernistas, uma sociedade só sobrevive quando seus integrantes assimilam e internalizam os valores e normas de determinado sistema social. Durkheim (2007) reforça essa ideia e ainda vai além, quando ressalta o papel do professor no processo de socialização e afirma que “a criança só pode conhecer o dever através de seus pais e mestres. É preciso que estes sejam para ela a encarnação e a personificação do dever. Isto é, que a autoridade moral seja a qualidade fundamental do educador”. A autoridade era usada como ferramenta para que o indivíduo criasse sua identificação com o sistema social através de uma relação de poder. De certa forma, no Modernismo, era a partir da ação educativa que se buscava um controle e equilíbrio nas relações de forças sociais.
As mudanças paradigmáticas que ocorreram no decorrer do século XX e ainda estão acontecendo no século XXI, tendem a ir contra o pensamento modernista de educar para “domesticar”, que pregava uma forma passiva de Educação mediante uma autoridade incontestável, a do educador, que transmite informações e imposições ao educando, este se tornando um mero receptor de conteúdos e ideais sem gerar o conhecimento. Através da negação da criatividade e da crítica era definido e ditado o perfil de cidadão que uma sociedade deveria ter. A crise pós-moderna abre espaço para pensar no homem como sujeito que é transformado e ao mesmo tempo transformador do mundo em que vive. Assim sendo, a Educação aparece como meio de trazer conscientização e libertação ao indivíduo, despertando nele a crítica e desenvolvendo a capacidade de interpretação, avaliação e análise de experiências individuais e coletivas. Vidal sugere que somente através da conscientização o homem consegue tomar consciência da realidade, e só assim descobre a si mesmo e suas relações com o mundo. Em um mundo de identidades fragmentadas, esse processo é fundamental para o homem sair de seu estado imerso na realidade, onde ele não tem capacidade de formular um pensamento crítico, para ir de encontro à descoberta de sua identidade e se tornar mais reflexivo sobre essa mesma realidade.
No entanto, ainda é difícil, nesse momento de transição, perceber ações educativas que prezem a formação do sujeito crítico. As instituições de ensino estão em decadência estrutural, com formas ultrapassadas de práticas pedagógicas e estratégias didáticas, além de espaços físicos deteriorados. A escola está em ruínas, assim como os demais pilares sociais pós-modernistas. As instituições educativas precisam ser percebidas como locais que permitam a discussão dialética a fim de garantir a possibilidade do indivíduo pensar por si mesmo. Para tal, os processos educativos devem ser pautados no diálogo e na construção do pensamento.
Freire (1997) defende essa ideia, a de que educar não é simplesmente transferir conteúdos, mas principalmente gerar a conscientização, e afirma que é apenas através do diálogo que a consciência é gerada. O diálogo é o principal elemento para que seja estabelecida uma relação aluno-professor sem autoritarismo, porém com a autoridade docente e a liberdade do aluno sendo mantidas. Esse processo de horizontalidade e igualdade permite ao indivíduo ser um sujeito atuante na realidade em que esteja inserido. Segundo Freire (1997 pg. 63), “o educador que ‘castra’ a curiosidade do educando em nome da eficácia da memorização do ensino dos conteúdos, tolhe a liberdade do educando, a sua capacidade de aventurar-se. Não forma, domestica”. O professor não deve ser detentor da verdade universal e nem a única voz dentro da sala de aula. Ensinar é compreendido então como um processo de estímulo ao pensamento e à autonomia, um processo de intervenção no mundo, de adaptação à mutabilidade social, tornando possível ao aluno tomar decisões e posições; aprender, dessa forma, passa a ser uma descoberta criadora, com abertura ao risco de ser, mas sabendo que a mudança é possível devido ao pensamento crítico.
Em outras palavras, o docente deve estar posicionado em um lugar que convide à interlocução dos diferentes, dos contrários ou dos antagônicos, estimulando sempre os alunos a estarem abertos ao diálogo e à reflexão. A escola deve educar para o pensar, democratizar o pensamento e evitar entrar no território do “pensar para impedir o pensar”. Para que isso ocorra, a escola deve ensinar a “aprender a aprender”. No que se refere ao ensino propriamente dito, ele deve ser feito de forma que o aluno possa aprender o todo e como os fundamentos e princípios de determinadas disciplinas se relacionam entre si e com o mundo.
Para Bruner (2001), o objetivo da aprendizagem deve focar na capacidade de aplicação daquilo que foi aprendido em outras esferas além da sala de aula. O professor deve mobilizar o aprendizado guiando o discente a fim de que ele possa desenvolver sua curiosidade diante de determinado tema, investigando e pesquisando o que se deve e quer aprender para que esse conhecimento possa ser usado para descobrir semelhanças entre ideias distintas. Ele acredita que o ensino de tópicos específicos, descontextualizados de suas aplicações, dificulta essa articulação entre diferentes conhecimentos e a transferência do conhecimento para situações extra-escolares, além de ser desestimulante para o aluno, pois o que é aprendido arbitrariamente não tem seu valor percebido claramente por ele. A Educação deve tratar o conhecimento como uma ferramenta para a realização plena das potencialidades humanas.
Diante das mudanças sociais que vêm ocorrendo no Pós-Modernismo, com a crise nas instituições sociais e a ruptura de identidades, é imprescindível uma reforma na cultura escolar, principalmente no que diz respeito ao professor, que deve participar ativamente nessa mudança de paradigmas. Esse professor, assim como o artista no mundo pós-moderno, deve pensar fora da caixa para se aproximar do universo do aluno e convidá-lo a ser co-autor do conhecimento produzido dentro de sala. Da mesma forma que a arte exterioriza suas criações através de obras, os alunos devem fazer o mesmo com seu conhecimento para fortalecer o sentido de identidade individual e do grupo. O currículo escolar deve refletir as naturezas do conhecimento e do processo de aquisição pelo aluno. A escola atual deve concentrar seus esforços no ensino do que Bruner (2001) chamou de “Três Grandes P’s”: o PASSADO, o PRESENTE e o POSSÍVEL.

Dados Bibliográficos

BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. Rio de Janeiro. Ed: J Zahar, 1998
_________. Modernidade e Ambivalência. Rio de Janeiro. Ed: J Zahar, 1999
_________. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro. Ed: J Zahar, 2001
BRUNER, Jerome. A Cultura da Educação. Porto Alegre. Ed: Artmed, 2001
DURKHEIM, Émile. Educação e Sociologia. São Paulo. Ed: Edições 70, 2007
FILHO, Luiz. A Crise na Educação. 12 jan 2008. Disponível em: www.pt.shvoong.com Acesso em 3 jun 2010
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Anatomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo. Ed: Paz e Terra, 1997
GOMES, Jomara B.; CASAGRANDE, Lisete D.R. A Educação Reflexiva na Pós-Modernidade: uma revisão bibliográfica. Revista Latino-Americana de Enfermagem, set/out 2002. Disponível em: www.eerp.usp.br/rlaenf Acesso em 3 jun 2010
HOLGONS, S. G. Siqueira. Pós-Modernidade e Educação. Jornal “A Razão”, 30 mai 2002. Disponível em: www.angelfire.com/sk/holgons/pos-modernidade.html Acesso em 25 mai 2010
MOCELLIM, Alan. A Questão da Identidade em Giddens e Bauman. (Pós-Graduação em Sociologia Política). Universidade Federal de Santa Catarina, 2008.
SANTOS, Jair F O que é Pós-Moderno. São Paulo. Ed: Brasiliense, 2000
VIDAL, Marciano. Conscientização. Disponível em: www.eumatil.vilabol.uol.com Acesso em 3 jun 2010

Alunos: Eduardo Nunes, Philipe Humberto, e Samantha Tietze

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