segunda-feira, 24 de maio de 2010

CALENDÁRIO PARA AS PRÓXIMAS AULAS

31/05 - Texto : "Cultura, mídias e identidades na Pós-modernidade" 
                                                                Lídia Miranda Coutinho
                                                                                                           Elisa Maria Quartiero

07/06 - Preparação para a AV2

14/06  e 21/06 - AV2

Abr,
Marco e Sheilane

PROFESSOR DESMOTIVADO E APÁTICO

http://www.geomundo.com.br/sala-dos-professores-20120.htm


A indisciplina nas salas de aula assumiu tais proporções que muitos professores estão com medo dos alunos. Não se trata da violência que, nos bairros pobres, ultrapassa os muros escolares e ameaça fisicamente os educadores, mas sim de um fenômeno de subversão do senso de hierarquia que ocorre em grandes redes de ensino privadas e também está presente em colégios tradicionais. Uma explicação parcial para essa mudança de comportamento é a seguinte: os alunos ignoram a autoridade do professor porque o vêem como uma espécie de empregado ou prestador de serviços, pago por seus pais. Uma das queixas mais comuns dos professores diz respeito ao sentimento de impotência diante de alunos indisciplinados. Certas escolas agem como se a lógica do comércio – aquela que diz que o freguês sempre tem razão – também valesse dentro da classe. "Os professores estão sofrendo de fobia escolar, antes um distúrbio psicológico exclusivo das crianças", diz o psicanalista Raymundo de Lima, professor do departamento de fundamentos da educação da Universidade Estadual de Maringá, no Paraná. (Veja, Edição 1904 . 11 de maio de 2005).

O professor que desenvolve fobia escolar sente um pavor profundo da escola e da sala de aula, acompanhado de alterações físicas como palpitações e tremores. Os ambulatórios psiquiátricos dos hospitais brasileiros já registraram o aumento dos casos de professores com distúrbios de ansiedade, entre eles a fobia escolar. "O número de professoras que têm procurado atendimento por estar estressadas, deprimidas ou sofrendo de crise do pânico aumentou cerca de 20% nos últimos três anos", diz Joel Rennó Júnior, coordenador do Projeto de Atenção à Saúde Mental da Mulher do Hospital das Clínicas de São Paulo. Até meados dos anos 90, esse tipo de distúrbio psicológico era um quase monopólio daqueles professores que trabalham em escolas públicas. Hoje, afeta igual quantidade de educadores de colégios particulares. (Veja, Edição 1904 . 11 de maio de 2005)

O professor acaba submetido a múltiplas pressões. É seu dever ensinar, impor disciplina aos alunos e, ao mesmo tempo, evitar que a escola perca "clientes". "Os esforços para passar a matéria equivalem a uma parcela mínima do desgaste físico e mental do professor", diz Marcos Hideaki Ono, de São Paulo, professor de física durante dez anos. O restante da energia é aplicado para controlar a classe, motivar os alunos e, às vezes, ensinar aos adolescentes princípios morais e éticos básicos. Ono, de 37 anos, conta que não suportava mais a agressividade dos alunos e, recentemente, abandonou o ensino para seguir carreira acadêmica em física. "Nos intervalos das aulas, era comum ver colegas tremendo de raiva ou chorando na sala de convivência dos professores", diz Ono. Uma de suas colegas pediu demissão depois que os alunos começaram a atirar-lhe moedas, insinuando que ela, por ser negra, era indigente. (Veja, Edição 1904 . 11 de maio de 2005)

Sempre fez parte do desafio do magistério administrar adolescentes com hormônios em ebulição e com o desejo natural da idade de desafiar as regras. A diferença é que, hoje, em muitos casos, a relação comercial entre a escola e os pais se sobrepõe à autoridade do professor. "Ouvi em muitas reuniões com coordenadores o lembrete de que os pais e os alunos devem ser tratados como clientes e, como tais, têm sempre razão", diz Iole Gritti de Barros, de 54 anos, professora aposentada. Durante 33 anos ela ministrou aulas de história para alunos da 5ª série em colégios particulares de São Paulo. Em algumas escolas, o temor de desagradar aos pais e perder os alunos acaba se sobrepondo à necessidade de impor ordem na sala de aula. A postura leniente com a disciplina explica-se, em parte, pelo número crescente de carteiras vazias. Em cinco anos foram abertas 2.000 novas instituições particulares de ensino fundamental e médio, enquanto a quantidade de alunos permaneceu inalterada. (Veja, Edição 1904 . 11 de maio de 2005)

Os pais entregaram a educação dos filhos aos colégios, mas alguns acham exageradas as exigências escolares ou as punições impostas aos indisciplinados. Também se vêem no direito de deixar o filho na escola com atraso ou buscá-lo mais cedo, a pretexto de viajar ou ir ao dentista – como se o horário de estudo não tivesse importância. Sem poder impor regras aos alunos, os professores acabam ficando impossibilitados de fazer aquilo que os pais esperam deles. A escola é um lugar onde as crianças aprendem a convivência em sociedade, com todas as suas regras. Ao perceberem que os pais estão sempre do seu lado, os estudantes ficam com a impressão de que tudo é permitido. "Um aluno chegou a me dizer que não iria fazer o que eu estava pedindo porque, como o pai dele pagava a escola, ele se comportava como queria lá dentro", diz a pernambucana Sandra Helena de Andrade, professora de português em duas escolas privadas do Recife.. (Veja, Edição 1904 . 11 de maio de 2005)

Hoje, a punição é cada vez mais rara, tanto na escola como em casa." Os pais têm larga parcela de culpa no que diz respeito à indisciplina dentro da classe. É uma situação cada vez mais comum: eles trabalham muito e têm menos tempo para dedicar à educação das crianças. Sentindo-se culpados pela omissão, evitam dizer não aos filhos e esperam que a escola assuma a função que deveria ser deles: a de passar para a criança os valores éticos e de comportamento básicos, diz a pedagoga carioca Tania Zagury, autora do livro Escola sem Conflito: Parceria com os Pais. (Veja, Edição 1904 . 11 de maio de 2005)

DECADÊNCIA DA CULTURA

DECADÊNCIA CULTURAL A PARTIR DO PROCESSO DE GLOBALIZAÇÃO COMANDADO PELA GRANDE MÍDIA


Historia Agora
Revista de Historia do tempo presente
http://www.historiaagora.com/
Carol Moryc 1

A arte é um dos modos pelos quais o homem atribui sentido à realidade que o cerca, e uma forma de organização que transforma a experiência, o vivido, em objeto de conhecimento, sendo, portanto, simbólica (MARTINS & ARANHA: 1998, p.136)

As artes levam-nos à dimensão estética da existência e – conforme o adágio que diz que a natureza imita a obra de arte – elas nos ensinam a ver o mundo esteticamente. Trata-se, enfim, de demonstrar que, em toda grande obra, de literatura, de cinema, de poesia, de música, de pintura, de escultura, há um pensamento profundo sobre a condição humana. (MORIN: 2000, p. 45).

A especificidade das obras de arte, a sua forma, não pode enquanto conteúdo sedimentado e modificado negar totalmente a sua origem. O êxito estético depende essencialmente de se o formato é capaz de despertar o conteúdo despertado na forma. Geralmente a hermenêutica das obras de arte é, pois, a transposição dos seus elementos formais em conteúdos. No entanto, estes não pertencem directamente às obras de arte como se elas recebessem simplesmente o conteúdo da realidade. O conteúdo constitui-se num movimento contrário. Imprime-se nas obras que dele se afastam. O progresso artístico, tanto quanto acerca dele se pode falar de modo convincente, é a totalidade desse movimento. Participa do conteúdo mediante a sua negação determinada. Quanto mais energicamente acontece, tanto mais as obras de arte se organizam segundo uma finalidade imanente e se constituem justamente assim, de modo progressivo, no contato com o que elas negam. (ADORNO: 1998, p. 161)

Para o consumidor, não há nada mais a classificar que não tenha sido antecipado no esquematismo da produção. A arte sem sonho destinada ao povo realiza aquele idealismo sonhador que ia longe demais para o idealismo crítico. Tudo vem da consciência, em Malebranche e Berkeley da consciência de Deus; na arte para as massas, da consciência terrena das equipes de produção. Não somente os tipos das canções de sucesso, os astros, as novelas ressurgem ciclicamente como invariantes fixos, mas o conteúdo específico do espectáculo é ele próprio derivado deles e só varia na aparência. Os detalhes tornam-se fungíveis. A breve sequência de intervalos, fácil de memorizar, como mostrou a canção de sucesso; o fracasso temporário do herói, que ele sabe suportar como good sport que é; a boa palmada que a namorada recebe da mão forte do astro; sua rude reserva em face da herdeira mimada são, como todos os detalhes, clichés prontos para serem empregados arbitrariamente aqui e ali e completamente definidos pela finalidade que lhes cabe no esquema. Confirmá-lo, compondo-o, eis aí sua razão de ser. Desde o começo do filme já se sabe como ele termina, quem é recompensado, e, ao escutar a música ligeira, o ouvido treinado é perfeitamente capaz, desde os primeiros compassos, de adivinhar o desenvolvimento do tema e sente-se feliz quando ele tem lugar como previsto. O número médio de palavras da short story é algo em que não se pode mexer. Até mesmo as gags, efeitos e piadas são calculados, assim como o quadro em que se inserem. Sua produção é administrada por especialistas, e sua pequena diversidade permite reparti-las facilmente no escritório. A indústria cultural desenvolveu-se com o predomínio que o efeito, a performance tangível e o detalhe técnico alcançaram sobre a obra, que era outrora o veículo da Idéia e com essa foi liquidada. Emancipando-se, o detalhe tornara-se rebelde e, do romantismo ao expressionismo, afirmara-se como expressão indómita, como veículo do protesto contra a organização. (HORKHEIMER: ADORNO: 1985, p. 117-118).

Sob o poder do monopólio, toda cultura de massas é idêntica, e seu esqueleto, a ossatura conceitual fabricada por aquele, começa a se delinear. Os dirigentes não estão mais sequer muito interessados em encobri-lo, seu poder se fortalece quanto mais brutalmente ele se confessa de público. O cinema e o rádio não precisam mais se apresentar como arte. A verdade de que não passam de um negócio, eles a utilizam como uma ideologia destinada a legitimar o lixo que propositadamente produzem. Eles se definem a si mesmos como indústrias, e as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores gerais suprimem toda dúvida quanto à necessidade social de seus produtos. (HORKHEIMER: ADORNO: 1985, p. 114)

A estrelização da sociedade iniciara com o cinema e a imprensa de grande público e vem explodindo há meio o século, ilustrando a crise dos valores que atravessou nossas sociedades. Ontem, havia outros valores: a política, a ciência, a religião, o mundo militar, agrícola etc., enfim, uma diversidade de legitimidades concorrentes. Hoje, tudo se alinhou à lógica midiática que se torna a principal legitimidade. (WOLTON: 2006, p.63).

Democrático, o rádio transforma-os a todos igualmente em ouvintes, para entregá-los autoritariamente aos programas, iguais uns aos outros, das diferentes estações. (ADORNO: HORKHEIMER: 1985, p. 114).

Um segundo princípio, particularmente importante no que diz respeito à literatura, é que a linguagem não pode ser considerada como um simples instrumento, utilitário ou decorativo, do pensamento. O homem não preexiste à linguagem, nem filogeneticamente nem ontogeneticamente. Jamais atingimos um estado em que o homem estivesse separado da linguagem, que elaboraria então para “exprimir” o que nele se passasse: é a linguagem que ensina a definição do homem, não o contrário. (BARTHES: 1998, p. 31-32).

(...) o escritor leva em conta, sabendo ou não, a recepção dos próximos, do público, e talvez da imprensa. Isto é, o sentido depende não somente das pulsões, do passado e das forças socioliterárias, mas de um certo modo do futuro que o escritor imagina que existirá em tal círculo social, na comunidade de escritores ou em tal escola literária... Aí intervém o fator estético, intimamente ligado a esse Outro que sustenta a cultura vigente. (WILLEMART: 1996, p 50).

Para Wolton, “o indivíduo que aprendeu a melhor se conhecer e a se expressar é também mais crítico e está disposto a questionar qualquer esquema tradicional.” (WOLTON: 2006, p. 30).

Bibliografia

ADORNO, Theodor. Prismas: crítica cultural e sociedade. Trad. Augustin Wernet e Jorge Mattos Brito de Almeida. São Paulo: Ática, 1998.
ADORNO, Theodor, & HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1985.
BARTHES, Roland. Rumor da língua: Escrever, verbo intransitivo? Trad. Mario Laranjeira. São Paulo: Brasiliende, 1988.
BRAGA, C. M.; MOURA, Heleniara Amorim . Temas da comédia brasileira na Primeira República. In: V Congresso de Ciências Humanas, Letras e Artes das Universidades Federais de Minas Gerais, 2001, Ouro Preto. Caderno de Resumos do V Congresso de Ciências Humanas, Letras e Artes das IFES de MG. Ouro Preto: Editora da UFOP, 2001
DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. Comentários sobre a sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1998.
MARTINS, Maria Helena; ARANHA, Maria L. de Arruda. Temas de filosofia. São Paulo: Editora Moderna, 1998.
MORIN, Edgar. A Cabeça Bem-Feita. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
SANTOS, José Luiz dos. O que é arte ed. São Paulo: Brasiliense, 2000. (Coleção Primeiros Passos; 46).
SANTOS, José Luiz dos. O que é cultura 14. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. (Coleção Primeiros Passos; 110).
WILEMART, Philipe. Universo da Criação Literária: crítica genética, crítica pós-moderna. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1993.
WOLTON, Dominique. É preciso salvar a comunicação. São Paulo: Paulus, 2006 – (coleção Comunicação).

CULTURA LÍQUIDA

http://www.livrariacultura.com.br/


SINOPSE
A modernidade imediata é 'leve', 'líquida', 'fluida' e infinitamente mais dinâmica que a modernidade 'sólida' que suplantou. A passagem de uma a outra acarretou profundas mudanças em todos os aspectos da vida humana. Zygmunt Bauman cumpre aqui sua missão de sociólogo, esclarecendo como se deu essa transição e nos auxiliando a repensar os conceitos e esquemas cognitivos usados para descrever a experiência individual humana e sua história conjunta. Este livro complementa e conclui a análise realizada pelo autor em 'Globalização - as conseqüências humanas' e 'Em Busca da Política'. Juntos, esses três volumes

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Um mal-estar líquido: sobre a obra de Zygmunt Bauman
Leonardo Moura
http://www.colheradacultural.com.b%20por/ Mr. Fork - 29 de julho de 2009
Léo Moura é nosso Mr. Fork da quinzena



Angústia e melancolia são sintomas do mal-estar da civilização moderna. Na pós-modernidade, condição do capitalismo contemporâneo, as mazelas da alma do ser humano não são diferentes. Pior: são ainda mais latentes, pois hoje a felicidade é um direito. E aparentemente está ao alcance de todos. Não conquistá-la é assumir-se um perdedor diante de um mundo que dá oportunidades para todos que querem ser donos de suas vidas.



Sentimento líquido

É à luz desta condição que o filósofo e cientista político polonês Zygmunt Bauman escreve seus livros sobre comunidade, política, cultura, identidade e sentimentos líquidos. Bauman crê num mundo que destrói as principais instituições capazes de acolher o indivíduo em situações de sucesso ou fracasso.



Para o autor, as duas principais instituições que hoje perdem força são a nação e a família. Em ritmo de ruptura, a pós-modernidade nos torna seres humanos de identidades líquidas, participando de culturas e comunidades líquidas e assumindo sentimentos líquidos.



Múltiplas identidades

Essa capacidade de multiplicar-se conforme a situação que conseguimos desenvolver é facilmente assimilada pelas ferramentas de redes sociais. Profetizadas pelos pensadores contemporâneos a Bauman de forma menos negativa (Stuart Hall e Erving Goffman), as redes sociais são instrumentos online nas quais o ser humano é capaz de mostrar todos os traços de sua personalidade. Numa rede social, é possível assumir que as múltiplas identidades estão previstas numa comunidade que comporta todas simultaneamente. A essa característica do mundo online e às suas relações pessoais Bauman faz crítica em "Vida para Consumo", salientando que os laços humanos, também líquidos, são conectados e desfeitos conforme conveniência.



A Vida Explica

De origem judaica, Bauman trabalhou no serviço secreto militar polonês. Em seu passado, há traços não divulgados ou aprofundados sobre sua relação com o sistema denuncista do comunismo polonês na gestão soviética. Bauman era leal ao Estado e aparentemente feroz com quem ia contra ele. Apesar disso, no final da década de 1960, exilou-se na Inglaterra, deixando a Universidade de Varsóvia e o serviço militar polonês por não concordar mais com campanhas antissemitas do governo em seu país natal.



Velhice Amena

Em Leeds, na Inglaterra, o professor e pensador começa a publicar seus livros sobre a liquidez dos valores, das instituições e dos sentimentos humanos, numa série que só no Brasil já foram publicados mais de quinze. Todos de tom niilista. O ápice do pensamento partidário de Bauman está no livro "Europa". Lançado em 2006 no Brasil, traz o cientista numa visão que dá gosto de ver, coerente com o que aparentemente parece certo para nosso futuro ocidental. Bauman acredita que só a Europa trará a mudança necessária para as instituições de hoje, corrigindo o caminho tortuoso e desagregador da identidade humana para o qual, na visão do pensador, caminha o mundo.



Mas talvez o livro mais complexo sobre o pensamento do cientista seja Em Busca da Política. Lançado em 2000 no Brasil, traz a análise do comportamento do ser humano ao procurar fazer política. Fica claro que o autor parte sempre do coletivo, ignorando as particularidades da identidade humana na qual seu maior influenciador, Freud, imergiu. Bauman vê a humanidade em desespero em busca de segurança, condição da base da hierarquia das necessidades humanas. E a segurança hoje é um item que só pode ser garantido individualmente, já que o pensador vê o claro desmantelamento do Estado, que sempre foi, na história europeia, o grande responsável pela segurança e o bem-estar.





Relação ao Brasil

Numa análise brasileira e individualista, é fácil enxergar que nem tudo que Bauman descreve está perdido. Temos em nosso país uma situação de instituições pouco eficientes. Porém, as classes ABC em nosso país conseguem se equiparar em ações afirmativas. Estas ações e discussões passam a iniciar ou se desenvolvem com propriedade em ambientes online. É uma estrutura diferente de iniciar um processo político. Mas é capaz de, numa sociedade conectada e impregnada pelo imaginário eletrônico -- como é a brasileira --, gerar movimentos e atitudes que reivindiquem mudanças na família e no Estado. Falamos aqui dos debates sobre emprego, raça, sexualidade, violência, segurança e drogas, tão avançados em nosso país, porém ainda não concluídos em forma de lei.



* Leonardo Moura é o carioca mais paulistano que existe. Trabalha há 10 anos em mídia segmentada e é autor de "Como Escrever na Rede -- Manual de Conteúdo para Internet" (Editora Record).

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SÍNTESE DE PE PAOLO CUGINI

http://blogdafaculdade.blogspot.com

Quem sou eu

Sou um padre italiano nascido na cidade de Reggio Emilia presente no Brasil desde o 1999.Já fui paróco de Miguel Calmon (2000-2005) e Tapiramutá (2005-2010). Atualmente sou pároco de Pintadas, uma paróquia que, como as outras,pertence a diocese de Ruy Barbosa-BA.Desde o 2004,ano de fundação da Faculdade,sou professor de filosofia na FAFS (Faculdade Arquidiocesana de Feira de Santana). O blog da faculdade foi criado com o objetivo de partilhar com os estudantes o material citado e utilizado durante os cursos que ministro.

Introdução

Sobre a vida num mundo líquido-moderno

Quando se patinha sobre o gelo fino, a segurança está na nossa velocidade.

Ralph Waldo Emerson, Sobre a prudência.

A “vida líquida” e a “modernidade líquida” estão intimamente ligadas. A “vida líquida” é uma forma de vida que tende a ser levada à frente numa sociedade líquido-moderna. “Líquido-moderna” é uma sociedade em que as condições sob as quais agem seus membros mudam num tempo mais curto do que aquele necessário para a consolidação, em hábitos e rotinas, das formas de agir. A liquidez da vida e da sociedade se alimentam e se revigoram mutuamente. A vida líquida, assim como a sociedade líquido-moderna, não pode manter a forma ou permanecer em seu curso por muito tempo.



Numa sociedade líquido-moderna, as realizações individuais não podem solidificar-se em posses permanentes porque, em um piscar de olhos, os ativos se transformam em passivos, e as capacidades, em incapacidades. As condições de ação e as estratégias de reação envelhecem rapidamente e se tornam absoletas antes de os atores terem uma chance de aprendê-las efetivamente. (pág.7)

Prever tendências futuras a partir de eventos passados torna-se cada dia mais arriscado e, freqüentemente, enganoso. É cada vez mais difícil fazer cálculos exatos, uma vez que os prognósticos seguros são inimagináveis.

A vida líquida é uma vida precária, vivida em condições de incerteza constante. As preocupações mais intensas e obstinadas que assombram esse tipo de vida são os temores de ser pego tirando uma soneca, não conseguir acompanhar a rapidez dos eventos, ficar para trás, deixar passar as datas de vencimento, ficar sobrecarregado de bens agora indesejáveis, perder o momento que pede mudança e mudar de rumo antes de tomar um caminho sem volta. A vida líquida é uma sucessão de reinícios, e precisamente por isso é que os finais rápidos e indolores. (pág.8)

As chances mais amplas de vitória pertencem às pessoas que circulam perto do topo da pirâmide do poder global, para as quais o espaço pouco significa e a distância não é problema. Pessoas que se consideram em casa em muitos lugares, mas em nenhum deles em particular. Tão leves, lépidas e voláteis quanto o comércio e as finanças cada vez mais globais e extraterritoriais que as assistiram no parto e que sustentam sua existência de nômades. (pág.10)

Ligações frouxas e compromissos revogáveis são os preceitos que orientam tudo aquilo em que se engajam e a que se apegam. (pág.11)

A leveza e a graça acompanham a liberdade – de movimento, de escolha, de deixar de ser o que se é e de se tornar o que ainda não se é. Os que estão do lado receptor da nova mobilidade planetária não têm essa liberdade. Não podem contar com a clemência daqueles em relação aos quais prefeririam manter distância nem com a tolerância daqueles de quem gostariam de estar mais próximos. (pág.12)

A eternidade é o óbvio rejeitado. Mas, não a infinitude. Enquanto esta durar, o presente permanece, o dia de hoje pode-se esticar para além de qualquer limite e acomodar tudo aquilo que um dia se almejou vivenciar apenas na plenitude do tempo. (pág.14 e 15)

Velocidade, e não duração, é o que importa. Com a velocidade certa, pode-se consumir toda a eternidade do presente contínuo da vida eterna. A incerteza de uma vida mortal em um universo imortal foi finalmente resolvida: agora é possível parar de se preocupar com as coisas eternas sem perder as maravilhas da eternidade. Com efeito, ao longo de uma vida mortal pode-se extrair tudo aquilo que a eternidade poderia oferecer. Talvez não se possa eliminar a restrição temporal da vida mortal, mas pode-se remover (ou pelo menos tentar) todos os limites das satisfações a serem vividas antes que se atinja o outro limite, o irremovível. (pág.15)

A vida líquida é uma vida de consumo. Projeta o mundo e todos os seus fragmentos animados e inanimados como objetos de consumo, ou seja, objetos que perdem a utilidade (e portanto o viço, a atração, o poder de sedução e o valor) enquanto são usados. Molda o julgamento e a avaliação de todos os fragmentos animados e inanimados do mundo segundo o padrão dos objetos de consumo. (pág.16 e 17)

As partes do mundo impróprias para o serviço, ou não mais capazes de realizá-lo, tornam-se irrelevantes e desassistidas, ou são descartadas e varridas para longe. Essas partes são apenas os detritos do zelo auto-reformista, sendo a lata de lixo seu destino natural. Pela lógica da vida líquida, preservá-las seria irracional. Para o próprio bem dessas partes, o direito de serem preservadas não pode ser facilmente defendido, e muito menos provado, pela lógica da vida líquida.

É por essa razão que o advento da sociedade líquido-moderna significou a morte das principais utopias da sociedade e, de modo mais geral, da idéia de “boa sociedade”. Se a vida líquida estimula algum interesse pela transformação social, a reforma postulada tem como principal objetivo empurrar a sociedade ainda mais em direção à rendição, uma a uma, de todas as suas pretensões de um valor próprio, com exceção do valor de uma força policial a preservar a segurança do “eus” que se auto-reformam, e à aceitação e ao entrincheiramento do princípio da compensação (versão política da “garantia de seu dinheiro de volta”) caso o policiamento fracasse ou seja considerado inadequado. (pág. 19 e 20)

O indivíduo sitiado

A individualidade é uma tarefa que a sociedade dos indivíduos estabelece para seus membros – como tarefa individual, a ser realizada individualmente por indivíduos que usam recursos individuais. E, no entanto, essa tarefa é autocontraditória e autofrustrante: na verdade, é impossível realizá-la.

Justamente com o desafio da individualidade, contudo, a sociedade dos indivíduos fornece a seus membros os meios de conviver com essa impossibilidade – ou, em outras palavras, de fechar os olhos à essencial e incurável impossibilidade da tarefa, ainda que o lote das tentativas fracassadas de realizá-la continue crescendo e se torne cada vez mais denso. (pág.29)

Como tarefa, a individualidade é o produto final de uma transformação societária disfarçada de descoberta pessoal. O emergir da individualidade assinalou um progressivo enfraquecimento, a desintegração ou destruição da densa rede de vínculos sociais que amarrava com força a totalidade das atividades da vida. (pág.31)

A idéia de “indivíduo” autoconstruído representou uma necessidade desse tipo quando os modernos marinheiros tomaram o lugar dos jangadeiros pré-modernos. Com a comunidade em retirada e seu sistema imunológico, destinado a evitar a contaminação por problemas, se transformando ele mesmo num problema, não era mais possível continuar cego e surdo à escolha da direção e à necessidade de manter-se no caminho. A “forma como são as coisas” virou “ a forma como as coisas devem ser feitas”. A sociedade (essa “comunidade imaginada” que substitui a comunidade oculta das vistas em sua própria luz ofuscante, ou um ambiente social que não precisava do, e nem teria sobrevivido ao, uso da imaginação a serviço da autovigilância) representava a nova necessidade (sem escolha) como um direito humano (duramente conquistado). (pág.32)

Cada membro da sociedade individualizada encontra alguns obstáculos no seu caminho para a individualidade de facto. Essa não é fácil de conseguir, muito menos de preservar. Entre a rápida sucessão de fichas simbólicas de identidade comumente usadas e endêmica instabilidade das escolhas que recomendam, a busca da individualidade significa uma luta para toda a vida. (pág.35)

Não admira que a individualização tenha seus descontentes e insatisfeitos. Juntamente com a linha de produção de consumidores felizes, há uma outra, menos intensamente anunciada, mas não menos eficientes, daqueles desqualificados, simultaneamente, do banquete do consumo e da corrida pela individualização. (pág.38)

A polarização já foi longe demais para que ainda seja possível elevar a qualidade de vida da população planetária ao nível dos países mais privilegiados do Ocidente. Como aponta John Reader, “se cada pessoa na Terra vivesse com tanto conforto quanto um cidadão da América do Norte, precisaríamos não de apenas um, mas de três planetas para suprir a todos”.[1]

Sendo esse o caso, a individualidade é e deverá continuar sendo por muito tempo um privilégio. Um privilégio dentro de cada uma das sociedades, quase autônomas, em que o jogo da auto-afirmação é levado à frente por meio da separação entre os consumidores “emancipados”, plenamente desenvolvidos – lutando para comprar para compor e recompor suas individualidades singulares a partir das “edições limitadas” dos últimos modelos da alta-costura -, e a massa sem rosto dos que estão “presos” e “fixos” a uma identidade sem escolha, atribuída ou imposta, sem perguntas, mas em todo caso “superdeterminada”. (pág.39)

Permitam-me repetir: a imagem da “cultura híbrida” é um verniz ideológico sobre a extraterritorialidade alcançada ou proclamada. Isenta da soberania de unidades políticas territorialmente circunscritas, tais como as redes extraterritoriais habitadas pela elite global, a “cultura híbrida” busca sua identidade na liberdade em relação a identidades designadas e inertes, na licença para desafiar e menosprezar os tipos de marcadores, rótulos ou estigmas culturais que circunscrevem e limitam os movimentos e as escolhas do resto das pessoas, presas ao lugar: os “locais”.

Para os que a praticam e usufruem, a nova “indeterminação” do ego tende a ser referida pelo nome de “liberdade”. Pode-se argumentar, porém, que ter uma identidade “indeterminada”, que é eminentemente “até segunda ordem”, não constrói um estado de liberdade, mas o recrutamento obrigatório e interminável para uma guerra de libertação que, em última instância, nunca é vitoriosa: uma batalha diária, sem folga permitida, para livrar-se, para esquecer. Quando a identidade deixou de ser um legado incômodo – (impossível de descartar), mas confortável (impossível de ser levada embora) – de ser uma vez por todas um ato de comprometimento que se espera e anseia que dure pela eternidade, e passou a ser a tarefa de toda a vida de indivíduos órfãos pela perda de heranças e privados de um céu verossímil para acreditar – ela deve ter transformando, e de fato o fez, num esforço eternamente inconcluso, assim como irritantemente ambivalente, para lavar as mãos em relação a antigos compromissos e escapar à ameaça de vir se envolver num comprometimento em relação ao qual os outros prazerosamente, e com sucesso, lavariam as mãos. A liberdade das pessoas em busca da identidade é parecida com a de um ciclista; a penalidade por parar de pedalar é cair, e deve-se continuar pedalando apenas para manter a postura ereta. A necessidade de continuar na labuta é um destino sem escolha, já que a alternativa é apavorante demais para ser considerada.

Vagando de um episódio para outro, vivendo cada um deles de olhos fechados a suas conseqüências e mais ignorante ainda em relação a seu destino, guiada pelo impulso de apagar a história passada em vez de pelo desejo de traçar o mapa do futuro, a identidade está presa para sempre no presente, tendo agora negada sua significação permanente como alicerce do futuro. A identidade luta para abraçar as coisas “sem as quais não se pode estar nem ser visto” hoje, embora totalmente consciente de que, muito provavelmente, estas se transformarão em coisas “com as quais não se pode estar nem ser visto” amanhã. O passado de cada identidade está salpicado de latas de lixos em que foram despejadas, uma por uma, as coisas indispensáveis de dois dias atrás, transformadas nos fardos incômodos de ontem.

O único “cerne identitário” que se pode ter certeza de que vai emergir da mudança contínua não apenas são e salvo, mas provavelmente até reforçado, é o homo eligens – o “homem que escolhe” (embora não o “homem que escolheu”!): um ego permanentemente impermanente, completamente incompleto, definitivamente indefinido – e autenticamente inautêntico. Sobre o empreendimento líquido-moderno, Richard Sennett escreveu: “Negócios perfeitamente viáveis são destruídos e abandonados, empregados capazes são lançados à deriva em vez de ser recompensados, simplesmente porque a organização tem de provar ao mercado que é capaz de mudar”.[2] Substitua “negócios” por “identidades”, “empregados capazes” por “propriedades e parceiros” e “organização” por “self” – e você terá uma descrição fiel do destino que define o homo eligens.

O homo eligens e o mercado de commodities coexistem em perfeita simbiose. Ambos não viveriam para ver o dia seguinte se não fossem apoiados e nutridos pela companhia um do outro. O mercado não sobreviveria caso os consumidores se apegassem às coisas. Para sua própria sobrevivência, não pode tolerar clientes comprometidos e leais ou que apenas se mantenham numa trajetória consistente e coesa que resista a desvios e evite saídas colaterais. (pág.46,47 e 48)

Em suma, a busca de dois valores, liberdade e segurança, ambos amplamente cobiçados, já que indispensáveis a uma vida digna e feliz, converge no atual discurso sobre a identidade. As duas linhas de busca notoriamente se evadem à coordenação, cada qual tentando a conduzir a um ponto além daquele em que a outra busca se arrisca a ser travada, interrompida ou mesmo invertida. Embora não se possa conceber uma vida digna ou satisfatória sem uma mistura tanto de liberdade quanto de segurança, dificilmente se consegue um equilíbrio satisfatório entre esses dois valores: se as tentativas do passado, inumeráveis e invariavelmente frustradas, servem para alguma coisa, esse equilíbrio pode muito bem ser inalcançável. Um déficit na segurança repercute na angustiante incerteza e, agora, fobia de que o “excesso de liberdade” – beirando uma permissão para o “tudo é válido” – inevitavelmente será nutrido. Um déficit de liberdade, por outro lado, é vivenciado com um debilitante excesso de segurança (a que os sofredores dão o codinome de “dependência”).

O problema, porém, é que, quando falta segurança, os agentes livres são privados da confiança sem a qual dificilmente se pode exercer a liberdade. Se uma segunda linha de trincheiras, poucas pessoas a não ser os aventureiros mais ousados têm suficiente coragem para enfrentar os riscos de um futuro desconhecido e incerto, e, sem uma rede segura, a maioria se recusará a dançar na corda bamba e se sentirá profundamente infeliz se forçada a fazê-lo contra a vontade.

Quando, por outro lado, o que falta é a liberdade, a segurança parece escravidão ou prisão. Pior ainda, quando se é submetido a essa situação por muito tempo sem intervalo e sem ter experimentado um outro modo de ser, mesmo a prisão pode sufocar o desejo de liberdade, juntamente com a capacidade de praticá-la, e então se transformar no único hábitat aparentemente natural e habitável – não sendo mais percebida como opressiva. (pág.50 e 51)

Qualquer aumento na liberdade pode ser traduzido como um decréscimo na segurança e vice-versa. As duas leituras se justificam, e qual delas se move para o centro da preocupação pública num determinado momento depende de outros fatores além dos elegantes argumentos apresentados para justificar a escolha. (pág.52)

Cada vez mais, os apelos por liberdade e a apresentação dessa liberdade como cura universal para os males presentes e futuros, assim como as demandas por afastar e empurrar do caminho quaisquer restrições que tolham os movimentos daqueles que esperam fazer bom uso do fato de ser estar movendo, levantam as suspeitas de parecer uma ideologia da elite global emergente. Recaem sobre ouvidos moucos de uma grande parcela da população do planeta e estão se transformando rapidamente num grande obstáculo ao diálogo planetário.

Simplificando um pouco, mas apenas um pouco, podemos dizer que, enquanto os beneficiários de nossa globalização perigosamente desequilibrada, instável e desigual vêem a liberdade desenfreada com o melhor meio de alcançar sua própria segurança, é numa horrorosa e lamentável insegurança que as vítimas dessa mesma globalização, pretendidas ou colaterais, suspeitam que o principal obstáculo está em se tornar livres (e fazer qualquer uso da liberdade se esta lhes for concebida). Parafraseando Jean Anouilh, poder-se-ia dizer que, mesmo que todos os homens pensem que a causa da liberdade está do seu lado, só os riscos e poderosos sabem que está. A carne se transforma em veneno do outro lado da mesa (ou do campo de batalha, como pode ser o caso e, cada vez com mais freqüência, é). (pág.53 e 54)

De mártir a herói e de herói a celebridade

A martirologia substitui e afastou gradualmente a mitologia do “pecado original” comum das religiões arcaicas. Também reverteu a mensagem contida na mitologia arcaica – contando a história dos primórdios do ato de violência não do ponto de vista dos assassinos, não da maneira como um “bando de matadores impenitentes” teria relatado sua ação malévola, mas do ponto de vista das vitimas. Em vez de justificar e enobrecer a violência cometida contra um inimigo infiel (geralmente um inimigo maligno, uma criatura estranha fisicamente defeituosa) como um sacrifício necessário para salvar a comunidade da perdição, como faziam os mitos arcaicos, as histórias de martírio preservadas na cultura pós-Abraão condenavam o chamado sacrifício como um ato de atrocidade abominável. Os dois tipos de história evocavam a multidão, cometiam, incitavam ou aplaudiam o assassinato. Mas se os mitos arcaicos condenavam as vítimas e glorificavam a multidão acuante e linchadora, as histórias de martírio denunciavam e censuravam as más intenções e a cegueira da multidão, ao mesmo tempo em que celebravam a retidão e a probidade de sua vítima – culpavam as turbas por perseguirem inocentes. (pág.56 e 57)

Os mártires são vítimas que sabiam disso – e preferiram morrer a mentir, conferindo desse modo a sua morte a significação de um testemunho de que há verdades que não podem ser caladas por gargantas grosseiras, não importa em que número. (pág.57 e 58)

Os mártires são pessoas que enfrentam desvantagens esmagadoras. Não apenas no sentido de que sua morte é quase certa, mas também de que seu derradeiro sacrifício provavelmente não será valorizado pelos espectadores, muito menos receberá deles o respeito que merece: talvez precise esperar muito tempo até mesmo para ser reconhecido como um sacrifício em prol de uma boa causa.

Concordando com o martírio, as potencias vítimas da horda furiosa colocam a lealdade à verdade acima de todos os cálculos de benefícios ou ganhos terrenos (materiais, tangíveis, racionais e pragmáticos), sejam eles genuínos ou putativos, individuais ou coletivos.

É isso que separa o mártir do herói moderno. O melhor que os mártires poderiam esperar em termos de ganho seria a derradeira prova de sua integridade moral, do arrependimento de seus pecados, da redenção de sua alma. Os heróis, por outro lado, são modernos – calculam perdas e ganhos, querem que seu sacrifício seja recompensado. (pág.58 e 59)

A sociedade de consumo líquido-moderna estabelecida na parte rica do planeta não tem espaço para mártires ou heróis, já que mina, despreza e milita contra os dois valores que desencadearam sua oferta e demanda. Em primeiro lugar, milita contra o sacrifício das satisfações imediatas em função de objetivos distantes e, portanto, contra a aceitação de um sofrimento prolongado tendo em vista a salvação na vida após a morte – ou, na versão secular, retarda a gratificação agora em nome de mais ganhos no futuro. Em segundo, questiona o valor de sacrificar satisfações individuais em nome de uma “causa” ou do bem-estar de um grupo (na verdade, nega a existência de grupos “maiores que a soma das partes” e de causas mais importantes do que a satisfação individual). Em suma, a sociedade de consumo líquido-moderna despreza os ideais do “longo prazo” e da “totalidade”. Num ambiente que promove os interesses do consumidor e é por eles sustentando, nenhum dessas ideais mantém o antigo poder de atração, encontra apoio na experiência cotidiana, está afinado com as reações treinadas ou se harmoniza com a intuição do senso comum. Assim sendo, tais ideais tendem a ser substituído pelos valores da gratificação instantânea e da felicidade individual. (pág.63 e 64)

Cultura: rebelde e ingovernável

Os criadores de cultura não têm escolha: são obrigados a conviver com esse paradoxo. Não importa o barulho com que protestem contra as pretensões e a interferência dos gerentes, precisam procurar um modus com-vivendi com a gerência para não afundar na irrelevância. Podem escolher entre gerentes com diferentes propósitos e que tratem a liberdade da criação cultura segundo diferentes projetos – mas decerto não entre aceitar e rejeitar o gerenciamento em si. Em todos os casos, não realisticamente. (pág.75)

A cultura mira, por assim dizer, “o pensamento” de tudo aquilo que atualmente passa por “realidade”. Não se preocupa com o que por acaso tenha sido posto na agenda do dia e definido como o imperativo do momento. Pelos menos se esforça por transcender o impacto limitador da “atualidade” assim definida, e luta para se livrar de suas demandas. (pág.76)

Por séculos a cultura viveu numa incômoda simbiose com o gerenciamento, lutando desconfortavelmente, por vezes sufocando nos braços dos gerentes – mas também correndo para eles em busca de abrigo e emergindo do encontro revigorada e reforçada. A cultura sobreviverá à mudança do gerenciamento? Ser-lhe-á permitido algo mais que uma existência efêmera, como a de uma borboleta? Será que o novo gerenciamento, fiel ao novo estilo de administração, limitará o seu encargo ao despojamento de recurso? Será que o cemitério dos “eventos culturais”, falecidos ou abortados, vai substituir o declive ascendente como metáfora adequada para a cultura? (pág.84)

Procurando refúgio na Caixa de Pandora

- ou medo segurança e a cidade

O solo sobre o qual nossas expectativas de vida têm de se apoiar é reconhecidamente instável – tal como nossos empregos e as empresa que os oferecem, nossos parceiros e redes de amizade, a posição que ocupam na sociedade e a auto-estima e auto-confiança dela decorrentes. O “progresso”, que já foi a mais extrema manifestação de otimismo radical, promessa de felicidade universalmente compartilhada e duradoura, deslocou-se para o pólo de previsão exatamente oposto, não-tópico e fatalista. Agora significa uma ameaça de mudança inflexível e inescapável que pressagia não a paz e o repouso, mas a crise e a tensão contínuas, impedindo qualquer momento de descanso; uma espécie de dança das cadeiras em que um segundo de desatenção resulta em prejuízo irreversível e exclusão inapelável. Em vez de grandes expectativas e doces sonhos , o “progresso” evoca uma insônia repleta de pesadelos de “ser deixado para trás”, perder o trem ou cair da janela de um veículo em rápida aceleração.

Incapazes de reduzir o ritmo espantoso da mudança, muito menos de prever e controlar sua direção, nós nos concentramos no que podemos ou acreditamos poder, ou no que nos garantem que podemos influenciar: tentamos calcular e minimizar o risco de nós pessoalmente, ou das pessoas que atualmente nos são mais próximas e mais queridas, sermos atingidas pelos incontáveis e indefiníveis perigos que o mundo opaco e seu futuro incerto nos reservam. (págs.91 e 92)

Podemos afirmar que as fontes de perigo se mudaram para o coração da cidade. Amigos, inimigos e sobretudo os ardilosos e misteriosos forasteiros que circulam ameaçadoramente entre os dois extremos agora se misturam e se esbarram nas ruas das metrópoles. A guerra contra a insegurança, os perigos e os riscos agora estão dentro da cidade, onde se definem os limites dos campos de batalha e se traçam as linhas entre as frentes. Trincheiras e bunkers fortemente blindados destinados a separar os estranhos, mantê-los à distância e barrar sua entrada estão se tornando rapidamente um dos aspectos mais visíveis das aglomerações urbanas contemporâneas – embora assumam diversas formas e seus arquitetos façam o possível para fundir suas criações à paisagem, “normalizando” desse modo o estado de emergência em que vivem os moradores viciados em segurança.

As formas mais comuns de fortalezas defensivas são as “comunidades fechadas” (com ênfase, segundo os folhetos dos corretores imobiliários e as práticas dos moradores, no “fecho”, não na “comunidade”), cada vez mais populares, com seguranças obrigatórias e monitores de vídeo na entrada. O número de “comunidades fechadas” nos Estados Unidos já passa de 20 mil, enquanto sua população é superior a 8 milhões de pessoas. O significado de “fechada” torna-se a cada ano mais elaborado: um condomínio da Califórnia chamado Desert Island, por exemplo, é cercado por um fosso de 25 acres. Brian Murphy construiu uma fachada de metal corrugado, sem janelas, ao estilo bunker. O mesmo arquiteto construiu outra casa luxuosa em Venice dentro dos muros de uma antiga estrutura em ruínas, cobrindo-a primeiro com grafites a fim de submergi-las num bairro totalmente entregue ao vandalismo.

A invisibilidade planejada e produzida é uma tendência que se espalha numa arquitetura urbana guiada pelo medo. Outra tendência é a intimidação, seja por um exterior atemorizante cuja aparência de fortaleza fica ainda mais desconcertante e humilhante devido a uma profusão de guaritas de verificação e segurança uniformizados altamente ostensivos, seja pela insolente e arrogante exibição de ornamentos provocativamente ricos, extravagantes e intimidantes. (págs.97 e 98)

A insegurança alimenta o medo. Não surpreende que a guerra contra a insegurança ocupe lugar de destaque na lista de prioridades dos planejadores urbanos; ou pelo menos estes acreditam que deveria e, se indagados, insistem nisso. O problema, porém, é que quando a insegurança se vai, a espontaneidade, a flexibilidade, a capacidade de surpreender e a oferta de aventuras, principais atrações da vida urbana, também tendem a desaparecer das ruas da cidade. A alternativa à insegurança não é a bênção da tranqüilidade, mas a maldição do tédio. É possível superar o medo e ao mesmo tempo fugir do tédio? Pode-se suspeitar que esse quebra-cabeça é o maior dilema a confrontar os planejadores e arquitetos urbanos – um dilema para o qual ainda não se encontrou solução convincente, satisfatória e incontestada, uma questão para a qual talvez não se possa achar uma resposta plenamente adequada, mas que (talvez pela mesma razão) continuará estimulando arquitetos e planejadores a produzir experimentos cada vez mais radicais e invenções cada vez mais ousadas. (pág.101)

Desde o início, as cidades têm sido lugares em que estranhos convivem em estreita proximidade, embora permanecendo estranhos. A companhia de estranhos é sempre assustadora (ainda que nem sempre temida), já que faz parte da natureza dos estranhos, diferentemente tanto dos amigos quanto dos inimigos, que suas intenções, maneiras de pensar e reações a condições comuns sejam desconhecidas ou não conhecidas o suficiente para que se possa calcular as probabilidades de sua conduta. Uma reunião de estranhos é um lócus de imprevisibilidade endêmica e incurável. Pode-se dizer isso de outra forma: os estranhos incorporam o risco. Não há risco sem pelo menos algum resquício de medo de um dano ou perda, mas sem risco também não há chance de ganho ou triunfo. Por essa razão, os ambientes carregados de risco não podem deixar de ser vistos como locais de intensa ambigüidade, o que, por sua vez, não deixa de evocar atitudes e reações ambivalentes. Os ambientes repletos de risco simultaneamente atraem e repelem, e o ponto em que uma reação se transforma no seu oposto é eminentemente variável e mutante, virtualmente impossível de apontar com segurança, que dirá de fixar. (pág.102)

Os espaços públicos são, por esses motivos, os locais em que a atração e a repulsão completam entre si em proporções que se alteram de modo rápido e contínuo. São, portanto, locais vulneráveis, expostos a ataques esquizofrênicos ou maníaco-depressivos, mas também os únicos em que a atração tem uma chance de superar ou neutralizar a repulsão. (págs.102 e 103)

Sejamos preciosos: isso se aplica não exatamente a quaisquer espaços públicos, mas apenas àqueles que se rendem tanto à ambição modernista de aniquilar a nivelar as diferenças quanto à tendência pós-modernistas de calcificar as diferenças por meio da separação e do estranhamento mútuos. Isso se aplica aos espaços públicos que reconhecem o valor criativo e de vivacidade da diferença, ao mesmo tempo em que encorajam as diversidades a se engajar num diálogo significativo. (pág.103)

Os consumidores na sociedade líquido-moderna

A sociedade de consumo tem por base a premissa de satisfazer desejos humanos de uma forma que nenhuma sociedade do passado pôde realizar ou sonhar. A promessa de satisfação, no entanto, só permanecerá sedutora enquanto o desejo continuar irrealizado; o que é mais importante, enquanto houver uma suspeita de que o desejo não foi plena e totalmente satisfeito. Estabelecer alvos fáceis, garantir a facilidade de acesso a bens adequados aos alvos desejos “legítimos” e “realistas” – isso seria como a morte anunciada da sociedade de consumo, da indústria de consumo e dos mercados de consumo. A não-satisfação dos desejos e a crença firme e eterna de que cada ato visando a satisfazê-los deixa muito a desejar e pode ser aperfeiçoado – são esses os volantes da economia que tem por alvo o consumidor.

A sociedade de consumo consegue tornar permanente a insatisfação. Uma forma de causar esse efeito é depreciar e desvalorizar os produtos de consumo logo depois de terem sido alçados ao universo dos desejos do consumidor. Uma outra forma, ainda mais eficaz, no entanto, se esconde da ribalta: o método de satisfazer toda necessidade/desejo/vontade de uma forma que não pode deixar de provocar novas necessidades/desejos/vontades. O que começa como necessidade deve terminar como compulsão ou vício. (págs. 106 e 107)

Essa paciência cujo tempo de duração foi radicalmente reduzido conduz à busca de fins rápidos e radicais para relacionamentos desagradáveis. Mas isso pode apresentar problemas específicos: para a maioria de nós, dizer a um parceiro que vá embora porque ele ou ela não fornece mais benefícios, ou os benefícios que fornece não são mais excitantes, pode, afinal, mostrar-se mais angustiante do que livrar-se de um carro velho ou de um computador defasado. (pág.115)

Corpo de consumo

O tipo de “consumidor ideal” que o mercado de consumo procura pode ser exemplificado por uma fábrica trabalhando a todo vapor 24 horas por dia, sete dias por semana, para garantir uma sucessão ininterrupta de desejos particulares de curta duração e altamente descartáveis. (pág.121)

Já que a idéia de boa forma oferece apenas vagas e incertas instruções práticas sobre o que fazer e o que evitar, e como nunca se pode estar certo de que as instruções não vão ser alteradas ou mesmo ser revogadas antes que se possa implementá-las na sua totalidade, lutar pela boa forma significa não ter descanso; de qualquer maneira, nunca imaginar que se possa descansar com a consciência tranqüila e sem apreensão. A pessoa devota à causa da boa forma está em constante movimento. Deve estar sempre mudando e pronta a novas mudanças. O lema do nosso tempo é “flexibilidade”: todas as formas devem ser maleáveis, todas as condições, temporárias, todos os formatos , passíveis de remodelagem. Reformar, de modo obsessivo e devotado, é tanto um dever quanto uma necessidade. (pág.124)

Infância de consumo

Ter filhos custa dinheiro – muito dinheiro. Ter um filho acarreta (ao menos para a mãe) uma considerável perda de renda e simultaneamente um considerável crescimento dos gastos familiares (diferentemente do que ocorria no passado, um filho é pura e simplesmente um consumidor – não contribui para a renda familiar). A Daycare Trust, uma instituição de caridade, calcula que o preço médio de uma vaga numa creche para uma criança de menos de dois anos chegou a 134 libras por semana no final de 2002, em relação à renda familiar, que atingiu a média de 256 libras por semana. [3] A remuneração média de uma babá que trabalha o dia inteiro reduziria o orçamento familiar em 18.546 libras por ano no interior, chegando a 27.320 libras em Londres. Como concluiu Brendan Benard, secretário geral do Trades Union Congress, “a impossibilidade de trabalhar porque o custo da assistência à infância continua muito distante do orçamento familiar está condenando centenas de milhares de famílias grandes a uma vida de pobreza”. Centenas de milhares de famílias já estão condenadas a viver na pobreza. Outras centenas de milhares observam o destino delas e tomam nota. (pág.136)

Vivemos agora numa sociedade de consumidores. O hábitat natural dos consumidores é o mercado, lugar de comprar e vender. No caso dos futuros consumidores, a respostas pronta e sincera ao fascínio das mercadorias e o impulso compulsivo e vicioso de comprar são as principais virtudes a ser plantadas e cultivadas; a indiferença à sedução administrada pelo mercado ou a falta de recursos para reagir adequadamente a suas exigências são pecados mortais que precisam ser erradicados ou punidos com o banimento.

Assim sendo, para ajustar seus membros ao novo hábitat natural (agora os shopping centers e a rua em que as mercadorias de grife compradas nas lojas são apresentadas ao público para dotar seus portadores do valor dessas mesmas mercadorias), a sociedade dos consumidores focaliza seu “reprocessamento da infância” no gerenciamento dos espíritos. Não importa os corpos – treiná-los é coisa do passado. A grande novidade, como diz Dany- Robert Dufour, é a conquista e realocação da alma.[4] (pág.145 e 146)

Aprendendo a andar sobre a areia movediça

Passaram-se mais de dois milênios desde que os antigos sábios da Grécia inventaram a noção de Paidéia para que a idéia de “educação por toda a vida” se transformasse de um oxímoro (uma contradição em termos) num pleonasmo (algo como “manteiga amanteigada” ou “ferro metálico”...). Essa notável transformação ocorreu bem recentemente, nas últimas décadas, sob o impacto do ritmo de mudança drasticamente acelerado no ambiente social em que os dois principais atores da educação – professores e discípulos – precisavam atuar.

No instante em que uma bala é disparada de uma arma de fogo, a direção e a distância a ser percorridas já foram decididas pela forma e posição da arma e pela quantidade de pólvora dentro da cápsula; pode-se calcular, com pouca ou nenhuma chance de erro o ponto que o projétil vai atingir, e pode-se escolher esse ponto movendo-se o cano da arma ou alterando a quantidade de pólvora. Essas qualidades dos mísseis balísticos fizeram deles armas ideais para ser utilizadas na guerra de trincheiras – em que os alvos permaneciam enterrados em suas trincheiras ou bunkers e os projéteis eram os únicos corpos em movimento. (pág.152)

As mesmas qualidades os tornam inúteis, contudo, quando alvos se forem mais rápidos que os projéteis, e ainda mais caso se mover – particularmente se forem mais rápidos que os projéteis, e ainda mais caso se movam de forma errática e imprevisível, derrubando os cálculos preliminares da trajetória planejada. Faz-se necessário então um míssil inteligente que possa mudar de direção no meio do caminho, dependendo das circunstâncias, que seja capaz de detectar imediatamente os movimentos do alvo, suas alterações de posição e velocidade – e dessas informações deduzir o ponto exato em que suas trajetórias se cruzarão. Esses mísseis inteligentes não podem suspender a coleta e o processamento de informações enquanto viajam, muito menos concluí-las – seu alvo nunca pára de se mover e mudar de direção e velocidade, de modo que a marcação do local de encontro deve ser constantemente atualizada e corrigida. (pág.153)

Podemos concluir que os mísseis inteligentes seguem uma estratégia de “racionalidade instrumental”, embora em sua versão liquidificada, fluída, por assim dizer, ou seja, abandonando o pressuposto de que o fim será dado, estável e estático, de modo que só os meios precisam ser calculados e manipulados. Mísseis ainda mais inteligentes não serão limitados a um alvo pré-selecionado, mas os escolherão enquanto prosseguem. O que vai guiá-los é mais a consideração de qual será o máximo que poderão alcançar dadas as suas capacidades técnicas e que potencial alvo estão mais equipados para atingir. Seria, podemos dizer, um caso de “racionalidade instrumental” invertida: os alvos são selecionados com os mísseis no ar, e são os meios disponíveis que decidem que “objetivo” acabará sendo selecionado. Nesse caso, a “inteligência” do míssil e sua eficácia se beneficiariam caso o equipamento fosse de uma natureza mais “generalista” ou “descomprometida”, sem focalizar uma categoria especifica de fins, nem estar superajustada para atingir um tipo de alvo particular.(pág.153)

Os mísseis inteligentes, tais como seus primos balísticos mais velhos, aprendem no caminho. De modo que o que se precisa fornecer-lhes desde o início é a capacidade de aprender, e aprender depressa. Isso é obvio. O que, no entanto, é menos visível, embora não menos cruel que a capacidade de aprender rapidamente, é a capacidade de esquecer instantaneamente o que se aprendeu antes. Os mísseis inteligentes não seriam inteligentes se não fossem capazes de “mudar de idéia” ou revogar as decisões prévias sem hesitação ou lamento... Não devem acalentar excessivamente as informações que adquirem nem desenvolver de maneira alguma o hábito de se comportar de acordo com essas informações. Todas as informações que recebem envelhecem rapidamente e, se não forem prontamente descartadas, podem desorientar em vez de fornecer uma orientação confiável. O que os “cérebros” dos mísseis inteligentes não podem jamais esquecer é que o conhecimento que adquirem é eminentemente descartável, bom apenas até segunda ordem e só temporariamente útil, e que a garantia do sucesso é não descuidar do momento em que o conhecimento adquirido não tem mais utilidade e precisa ser jogado fora, esquecido e substituído. (pág.153 e 154)

Os filósofos da educação da era sólido-moderna viam os professores como lançadores de mísseis balísticos e os instruíram sobre como garantir que seus produtos permanecessem estritamente no curso predeterminado pelo impulso original. E não admira que, nos estágios iniciais da era moderna, os mísseis balísticos eram a maior realização da inventividade técnica humana. Prestavam um serviço impecável a quem desejasse conquistar e dominar o mundo tal como ele era. Como Hilaire Belloc declarou confidencialmente, referindo-se aos nativos africanos, “Aconteça o que acontecer, nós temos a arma de Maxim, e eles não” (a arma inventada por Hiram Stevens Maxim, permitam-me lembrar, era uma máquina para lançar um grande número de balas num curto espaço de tempo, e só funcionava se houvesse muitas dessas balas à mão). Na verdade, porém, essa visão da tarefa do professor e do destino do discípulo era muito mais antiga do que a idéia de “míssil balístico” e do que a Era Moderna que o inventou – há um antigo provérbio chinês que precede de dois mil anos a modernidade, mas ainda é citado pela Comissão das Comunidades Européias, no limiar do século XXI, em apoio ao seu programa “Aprendizagem por toda a vida”: “Planejando para um ano, plante milho. Planejando para uma década, plante árvores. Planejando para vida, treine e eduque pessoa.” Só como a entrada nos tempos líquido-modernos é que a antiga sabedoria perdeu seu valor pragmático e as pessoas preocupados em aprender e com a promoção da aprendizagem conhecida pelo nome de “educação” tiveram de mudar sua atenção dos mísseis balísticos para os inteligentes.

Mais precisamente, no ambiente líquido-moderno a educação e a aprendizagem, para terem alguma utilidade, devem ser contínuas e realmente por toda a vida. Nenhum outro tipo de educação ou aprendizagem é concebível; a “formação” dos eus ou personalidades é impensável de qualquer outra forma que não seja uma reformação permanente e eternamente inconclusa. (pág. 154 e 155)

Pode-se dizer que em nenhuma outra época o ato da escolha foi tão exacerbadamente autoconsciente como agora, conduzindo como o é em condições de dolorosa mais incurável incerteza, sob a ameaça constante de “ficar para trás” e ser excluído do jogo e impedido de obter qualquer retorno pelo fracasso em atender às novas demandas. (pág.155)

Hoje em dia, o conhecimento precisa ser constantemente renovado, as próprias profissões precisam mudar; do contrário, todo o esforço para ganhar a vida vai dar em nada.”[5] Em outras palavras, o impetuoso crescimento do novo conhecimento prévio se combinam para produzir ignorância humana em grande escala e para reabastecer continuamente, talvez até ampliar, o estoque. (pág.156)

No ambiente liquído-moderno, a educação e a aprendizagem, para terem alguma utilidade, devem ser permanentes e realmente ocorrer ao longo da vida. Espero que agora possamos ver que uma das razões, talvez a decisiva, pela qual elas devem ser permanentes e ocorrer ao longo da vida é a natureza da tarefa com que nos confrontamos na estrada compartilhada que leva ao “capacitamento” – tarefa que é como deve exatamente ser a educação: contínua, sem fim, ocorrendo ao longo da vida.

É assim mesmo que a educação deve ser para que os homens e mulheres do mundo liquído-moderno possam perseguir seus objetivos existenciais com pelo menos um pouco de engenhosidade e autoconfiança, e esperar ter sucesso. Mas há outra razão, menos discutida, embora mais poderosa do que aquela que temos discutido até agora: não se refere a adaptar as habilidades humanas ao ritmo acelerado da mudança mundial, mas a tornar esse mundo em rápida mudança mais hospitaleiro para a humanidade. (pág.163 e 164)

Nesse cenário de ignorância, é fácil sentir-se perdido e infeliz - e mais fácil ainda é estar perdido e infeliz sem perceber isso. Como Pierre Bourdieu memoravelmente observou, a pessoa que não tem domínio do presente não pode sonhar em controlar o futuro. (pág.166)

A ignorância produz a paralisia da vontade. A pessoa não sabe o que lhe está reservado nem tem como avaliar os riscos. Para autoridades impacientes com as restrições impostas aos detentores do poder por uma democracia viva e animada, esse tipo de impotência do eleitorado, produzido pela ignorância, e a descrença generalizada na eficácia do dissenso, juntamente com a falta de disposição para se envolver politicamente, são fontes de capital político necessários e bem-vindas: a dominação por meio as ignorância e da incerteza deliberadamente cultivadas é mais confiável e barata do que um governo com base num profundo debate dos fatos e num longo esforço de atingir a concordância quanto à verdade e às formas menos arriscadas de proceder. (pág.166)

A ignorância política tem a capacidade de se autoperpetuar, e uma corda feita de ignorância e inação vem a calhar quando a voz da democracia corre o perigo de ser sufocada ou ter suas mãos atadas.

Precisamos da educação ao longo da vida para termos escolha. Mas precisamos dela ainda mais para preservar as condições que tornam essa escolha possível e a colocam ao nosso alcance. (pág.166 e 167)

O pensamento em tempos sombrios

(Arendt e Adorno revisitados)

O passado tende a ser destruído de modo incansável e sistemático, tornando praticamente impossível a redenção das esperanças, de modo que os indivíduos “são reduzidos à mera seqüência de experiências instantâneas que não deixam traço, ou então cujo traço é odiado como irracional, supérfluo ou ‘suplantado’ no sentido literal do termo”.[6] Quando os indivíduos se tornam assim reduzidos, é pouco provável que busquem segurança na esperança , ou seja, numa causa que ainda deve consolidar-se na realidade. (pág.175)

A lógica da responsabilidade planetária visa a, ao menos em principio, confrontar os problemas gerados globalmente de maneira direta – no seu próprio nível. Parte do pressuposto de que soluções permanentes e verdadeiramente eficazes para os problemas de âmbito planetário só podem ser encontradas e funcionar por meio da renegociação e reforma das redes de interdependências e interações globais. Em vez de se voltar à limitação dos prejuízos e benefícios locais, resultantes das guinadas caprichosas e acidentais das forças econômicas globais, deve-se buscar em novo tipo de ambiente global em que os itinerários das iniciativas econômicas tomadas em qualquer lugar do planeta não sejam mais extravagantes, guiados apenas pelos ganhos momentâneos, sem prestar atenção aos efeitos indesejados e às “baixas colaterais”, nem dar importância às dimensões sociais dos cálculos de custo-benefício. Em suma, essa lógica está voltada, citando Habermas, para o desenvolvimento de uma “política que possa nivelar-se com os mercados globais”.

Nós sentimos, imaginamos, suspeitamos o que deve ser feito. Mas não podemos conhecer o aspecto e a forma que isso acabará assumindo. Podemos estar bem certos, contudo, de que esse aspecto não será familiar. Será bem diferente de tudo aquilo a que estamos acostumados.

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[1] John Reader, Cities (Heinemann, 2004), p.303, citado M. Wackernagel e William E. Reeves, Our ecological Footprint: Reducing Human Impact on Earth (New Society Publishers, 1996), p.13-14.

[2] The Corrosion of Character: The Personal Consequences of Work in the New Capitalism (W.W. Norton, 1982), p.51.

[3] Ver “Childcare rises to 25 per cent of income”, Guardian, 26 jan 2004.

[4] Dufour, L’Art de réduire lês têtes, p.10.

[5] Jacek Wojciechowski, “Studia podyplomowe”, Fórum Akademickie, 5 (2004)

EDUCAÇÃO E PÓS-MODERNIDADE

EDUCAÇÃO E PÓS-MODERNIDADE
Pós-modernidade Ética e Educação
Por Pedro Georgen
Resenha do livro de Pedro Goergen (Campinas: Autores Associados, 2001, Coleção Polêmicas do Nosso Tempo: 79).

** Professor Livre Docente do Departamento de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Educação (Defhe/FE) da Unicamp.

O que me parece importante reter desse imenso debate que envolveu e continua chamando a atenção de tantas personalidades importantes do mundo intelectual contemporâneo é que certamente seria apressado declarar tout court o fim da história ou o esgotamento da racionalidade moderna, mas, também, que é impossível passar ao longo das importantes e profundas transformações que estão ocorrendo no mundo contemporâneo que, se não configuram um novo paradigma de racionalidade, representam, contudo, interferências no mundo epistêmico das quais ainda nos é impossível imaginar todas as conseqüências. (p. 35)

A ação comunicativa permite a passagem da subjetividade para a intersubjetividade e, além disso, um relacionamento diferenciado com o mundo objetivo. É também pela ação comunicativa, a forma privilegiada de relacionamento entre as pessoas, que se pode questionar/validar valores ou normas e estabelecer sanções. A ação comunicativa permite explicitar as expectativas das pessoas umas com relação às outras e, a partir disso, fixar normas de comportamento, zelar pela sua manutenção e estabelecer formas de sanção. (p. 43)

(...) pode-se dizer que Habermas busca embasar as normas éticas, orientadoras da ação humana, num processo de discurso prático que, preservadas a sua peculiaridade e formas processuais de validação, tem o mesmo status epistêmico do discurso teórico (científico). A norma validada no processo do discurso prático deve permanecer estritamente no chão da história, transcendendo, porém, o particularismo ético, defendido pelos pós-modernos. (p. 42-48)

O que, na verdade, parece estar ocorrendo, pelo menos no campo da educação, é a defesa de um discurso (pós-moderno), supostamente fundado numa nova realidade que declara superadas as premissas epistêmicas da modernidade, mas que não perde tempo em conferir se na educação é efetivamente esta a situação que se vive e nem se preocupa com as conseqüências práticas de suas formulações. De fato, embora o cenário educativo esteja se transformando no sentido de estar abrindo mão de um projeto verdadeiramente formativo, não me parece concluir da constatação desta, diria, patologia, o desvanecimento de seus fundamentos racionais. (p. 69)

Pesquisa, educação e pós-modernidade: Confrontos e dilemas  Bernadete A. Gatti
Departamento de Pesquisas Educacionais, Fundação Carlos Chagas e Programa de Pós- Graduação em Psicologia da Educação, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo gatti@fcc.org.br

...se anunciara como caminho seguro para a autonomia e liberdade do homem, revelar-se-ia, ao final, o mais radical e insensível inimigo do homem por transformá-lo em objeto a serviço dos ditames da performatividade cientifico-tecnológica. A eficiência aliada ao nível de norma suprema da razão impôs o abandono dos ideais e fins humanos. (1996, p.22)

...como transmitido de forma comunicacional, a racionalidade limita-se а capacidade de participantes responsáveis em interações de se orientarem em relação a exigências de validade que assentam sobre o reconhecimento intersubjetivo. (1990, p.289)

...teve um imenso sucesso. A explicação de qualquer fenômeno natural, em termos de leis deterministas, parecia estar а disposição e, uma vez que contássemos com essas leis básicas, daí derivaria todo o resto (a vida, nossa consciência humana) por simples dedução. Com isso, as leis й que existem, não os eventos(1996, p.26-27).

...que espécie de currículo deveremos ter na escola para enfrentar esse desafio? De quais características da modernidade e do currículo moderno, deveremos livrar-nos a fim de fazer com que a escola consiga se alinhar aos novos tempos? O que conservar? Quais modismos evitar? [...] Quais valores, práticas e identidades são, em princípio, dignos de respeito e porque? (2000, p.215).

...aquilo que й preciso saber para ser aprovado, que se aprende na escola e não se usa para mais nada, e aquilo que й preciso saber para viver, que, em geral, aprende-se pela televisão, cada dia menos controlável pela população e mais inclinada ao despropósito como meio de chamar a atenção. (2000, p.201)

...ao contrário, não existem referências fixas no que se refere aos valores e aos comportamentos morais, que hoje entendemos basicamente como fatos opináveis, contingentes e discutíveis, pouco aptos, portanto, para uma transmissão sistemática e apoiada em um saber profissional. (2000, p.203)


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CULTURA PÓS-MODERNIDADE

http://www.scielo.com.br/

Quem é cada um de nós senão uma combinatória de experiências, de informações, de leituras, de imaginações? (Italo Calvino)

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Como o esquizofrênico, o indivíduo pós-moderno enfoca determinadas experiências e imagen desconectadas, isoladas, e que não se articulam em seqüências coerentes, sendo este enfoque feito com intensa imersão e imediatismo. Isto quer dizer que o tempo e a história não constituem mais uma lógica compreendendo processos e relações sociais reais; a história reduz-se a significantes (estilos, referências, imagens, objetos) que podem circular independentemente de seus contextos originais. Neste quadro, a posição dos indivíduos pode ser assim caracterizada: "apatia em relação ao passado; renúncia sobre o futuro e uma determinação de viver um dia de cada vez" (Anthony Giddens)

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Doc. Internet – Caminhos para Inclusão humana
Editora Didática – www.edukbr.com

Reconhecer que podemos promover uma nova forma de aprendizagem, muitas vezes longe do que pretendíamos como objetivo principal, acredito que aí esteja a arte em ser educadora. Ver o que não está no aparente, no pedagógico, no conteúdo programado, no concreto, mas considerar o crescimento humano que a pessoa adquiriu durante aquela experiência. Como educadora considero isso como relevante porque ficará por toda vida!
“Tudo isso é aprender. E aprender é sempre adquirir uma força para outras vitórias, na sucessão interminável da vida”. (Cecília Meireles).

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Educação contemporânea: A sociedade autolimpante, o sujeito obsoleto e a aposta na escolha
Prof: Dr. Rogerio de Almeida

Por isso, se a coisa abriu-se embaixo e o fascínio pelo blefe superou o reflexo de toda tradição, é porque a coisa abriu-se em cima. Como? Pela falência. A igreja faliu – quanto ao domínio da fé; a justiça faliu – quanto à aplicação da lei; a família faliu – quanto à sua representação; o valor aristocrata/burguês faliu – porque agora pertence a todos; a cidade faliu – como idéia de uma coexistência pacífica. E se tudo faliu, é porque tudo apareceu, é porque a sua aura deixou-se sob o seu próprio blefe e se entregou a sua própria condição: ser pervertida (Kodo, 2001: 41)

Em quase todas as épocas, a grande característica do gozo foi a sua obscuridade. Era bem distinto o pequeno espaço do vinho do grande espaço do pão. E a realidade se dava aí, opondo os escravos confessos aos sensualistas (...). Aquele que se amarra ao pão não se satisfaz com o riso ou com as caricaturas. Ele se reconhece pelo seu vazio erótico, por sua fé às coisas estéreis e por sua seriedade. O poder é sério, o trabalho é sério, o pão é sério. O pão exige mãos, exige a forja, forma-se do trigo – que é trabalhado – e vai se encontrar com as grandes leis de quem se queima no 7 forno. Dessas leis vem o seu recato e a sua aversão ao gozo (Kodo, 2001: 24-25)

A deambulação, o encontro, o azar objetivo, tudo isso dá conta também da iniciação pessoal, que faz de cada indivíduo um elemento de um grande conjunto coletivo. Essa perspectiva ultrapassa, a um só tempo, o 8 subjetivismo psicologista e o objetivismo dos diversos positivismos. Uma dimensão impessoal do homem, aquém ou além do individual, é que pode nos introduzir na organicidade social e natural; é o que permite tornar preciso o que chamei de transcendente imanência, que estrutura a socialidade (Maffesoli, 2005: 55)

Distribuidor de alegrias em abundância, Dioniso era o deus que incitava os homens a gozar à larga, a deixar-se levar, provando tanto os prazeres simples quanto os gozos da bacanal extática. E é precisamente esse ethos de alegria que nós redescobrimos, declaram seus novos apóstolos, insistindo na nova cultura cotidiana que presta um culto às sensações imediatas, aos prazeres do corpo e dos sentidos, às volúpias do presente. (...) Digamos com toda a clareza: a meu ver, não se poderia estar mais enganado no diagnóstico. Pois o que é que, em nossos dias, não está cercado de ameaças, de incertezas e de riscos? O emprego, o planeta, as novas tecnologias, a globalização, a vida sexual, a escolha dos estudos, as aposentadorias, a imigração, os 'subúrbios', quase tudo é suscetível de alimentar os sentimentos de inquietação (Lipovestky, 2008: 237).

O equívoco que separa essa instituição de seus usuários vem crescendo: a escola é moderna, os alunos são pós-modernos; ela tem por objetivo formar os espíritos, eles lhe opõem a atenção flutuante do jovem telespectador; ela tende, segundo Condorcet, 'a extinguir os limites entre a porção inculta e a porção esclarecida do gênero humano', eles retraduzem essa intenção mancipadora em programa arcaico de subjugação e confundem, numa mesma rejeição de autoridade, a disciplina com a transmissão, o mestre que instrui com o mestre que domina (Finkielkraut, 1989: 148). O 'possível' de Kierkegaard não remete a um juízo sobre o advir das coisas ou o sobrevir de um estado de coisas, mas caracteriza o existir do homem.

A vida não é apenas bios, que tem seu movimento próprio do nascimento à morte. A vida do homem é existência, é relação com o mundo e com os outros; é preocupação com sua sobrevivência, é antecipação e projeto, desenvolvimento de um programa que está se escrevendo, saída fora de si da vida, é essa continuidade contrariada por descontinuidades, as das escolhas que é preciso efetuar o tempo todo. O existir é contingência absoluta: o existir não conhece outra necessidade a não ser a das escolhas exigidas por um existir livre sem determinação (Le Blanc, 2003: 48).

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Identidade-Diferença na contemporaneidade – uma visão pós-moderna
Any Leal Ivo Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia - PPGAU anybivo@hotmail.com
Fábio Velame Doutorando do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia - PPGA Fabio.velame@hotmail.com

Um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. Isso está fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que, no passado, nos tinha fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais. Estas transformações estão também mudando nossas identidades pessoais, abalando a idéia que temos de nóspróprios como sujeitos integrados. Esta perda de um ‘’sentido de si’’ estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento - descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos – constitui uma ‘’crise de identidade’’ para o indivíduo (HALL, 2006, p.09).

É nisso que nós, habitantes do líquido mundo moderno, somos diferentes. Buscamos, construímos e mantemos as referências comunais de nossas identidades em movimento – lutando para nos juntarmos à grupos igualmente móveis e velozes que procuramos, construímos e tentamos manter juntos por um momento, mas não há muito tempo. (BAUMAN, 2005, p.26)

A idéia de “identidade” nasceu da crise do pertencimento e do esforço que esta desencadeou no sentido de transpor a brecha entre o “deve” e o “é” e erguer a realidade ao nível dos padrões estabelecidos pela idéia - recriar a realidade à semelhança da idéia. (BAUMAN, 2005,p.26)

Afirma ainda,
A idéia de “identidade”, e particularmente de “identidade nacional”, não foi naturalmente gestada e incubada na experiência humana, não emergiu dessa experiência como “fato da vida” auto-evidente. Essa idéia foi forjada a entrar na Lebenswelt de homens e mulheres modernos – e chegou como uma ficção. (BAUMAN, 2005, p.26)

Pode-se reclamar de todos esses desconfortos e, em desespero, buscar a redenção, ou pelo menos o descanso, num sonho de pertencimento. Mas também se pode fazer desse fato de não ter escolha uma vocação, uma missão, um destino conscientemente escolhido – ainda mais pelos benefícios que tal decisão pode trazer para os que a tomam e a levam a cabo, e pelos prováveis benefícios que estes podem então oferecer a outras pessoas. (BAUMAN, 2005, p.20)

As “Identidades” flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha, mas outras infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é preciso estar em alerta constate para defender as primeiras em relação às ultimas. (BAUMAN, 2005, p.19)

Em nosso mundo de “individualização” em excesso, as identidades são bênção ambíguas. Oscilam entre o sonho e o pesadelo, e não há como dizer quando um se transforma no outro. Na maior parte do tempo, essas duas modalidades líquidomodernas de identidades coabitam, mesmo que localizadas em níveis diferentes de consciência. Num ambiente de vida líquido-moderno, as identidades talvez sejam as encarnações mais comuns, mais aguçadas, mais profundamente sentidas e perturbadoras da ambivalência. É por isso, diria eu, que estão firmemente assentadas no próprio cerne da questão da atenção dos indivíduos líquido-modernos e colocada no topo de seus debates existenciais. (BAUMAN, 2005, p.38)

Até mesmo o patriotismo, ativo mais zelosamente preservado pelos Estados-nações modernos, foi transferido às forças do mercado e por elas remodelados para aumentar o lucro dos promotores do esporte, do show businesss, de festividades comemorativas e da memorabilia. (BAUMAN, 2005,p.34)

Os confinamentos são moldes, distintas moldagens, mas os controles são uma modulação, como uma moldagem auto-deformante que mudasse continuamente, a cada instante, ou como uma peneira cujas malhas mudassem de um ponto a outro [...]Nas sociedades de controle, ao contrário, o essencial não é mais uma assinatura e nem um número, mas uma cifra: a cifra é uma senha, ao passo que as sociedades disciplinares são reguladas por palavras de ordem (tanto do ponto de vista da integração quanto da resistência). A linguagem numérica do controle é feita de cifras, que marcam o acesso à informação, ou a rejeição. Não se está mais diante do par massa-indivíduo. Os indivíduos tornaram-se "dividuais", divisíveis, e as massas tornaram-se amostras, dados, mercados ou "bancos". É o dinheiro que talvez melhor exprima a distinção entre as duas sociedades, visto que a disciplina sempre se referiu a moedas cunhadas em ouro - que servia de medida padrão -, ao passo que o controle remete a trocas flutuantes, modulações que fazem intervir como cifra uma percentagem de diferentes amostras de moeda. (DELEUZE, 1992, p. 219-226).

Deleuze afirma ainda,

O marketing é agora o instrumento de controle social, e forma a raça impudente dos nossos senhores. O controle é de curto prazo e de rotação rápida, mas também contínuo e ilimitado, ao passo que a disciplina era de longa duração, infinita e descontínua. O homem não é mais o homem confinado, mas o homem endividado. (DELEUZE, 1992, p. 219-226).

Quase todos os materiais têm sido experimentados, e o que não foi tentado acabará sendo – e o mercado de consumo se rejubila, enchendo galpões e prateleiras com novos símbolos de identidade, originais e tentadores, já que não foram aprovados nem testados. Há também um outro fenômeno a observar: a expectativa de vida cada vez menor da maioria das identidades simuladas, conjugadas à crescente velocidade da renovação de seus estoques. (BAUMAN, 2005,p.88)

Você assume uma identidade num momento, mas muitas outras ainda não testadas estão na esquina esperando que você escolha. Muitas outras identidades são 9 Deleuze trata a Sociedade do Controle em substituição a Sociedade Disciplinadora:´´...as sociedades de controle que estão substituindo as sociedades disciplinares. "Controle" é o nome que Burroughs propõe para designar o novo monstro, e que Foucault reconhece como nosso futuro próximo. Paul Virillo também analisa sem parar as formas ultra-rápidas de controle ao ar livre, que substituem as antigas disciplinas que operavam na duração de um sistema fechado...´´ (DELEUZE, 1992, p.219-226), sonhadas ainda estão por ser inventadas e cobiçadas durante sua vida. Você nunca saberá ao certo se a identidade que agora exibe é a melhor que pode obter e que provavelmente lhe trará maior satisfação. (BAUMAN, 2005,p.26)

Num dos pólos da hierarquia global emergente estão aqueles que constituem e desarticulam as suas identidades mais ou menos a própria vontade, escolhendo-as no leque de ofertas extraordinariamente amplos, de abrangência planetária. No outro pólo se abarrotam aqueles que tiveram negado o acesso à escolha da identidade, que não têm o direito de manifestar as suas preferências e que no final se vêem oprimidos por identidades aplicadas e impostas por outros – identidades que eles próprios se ressentem, mas não têm permissão de abandonar nem das quais conseguem se livrar. Identidades que estereotipam, humilham, desumanizam, estigmatizam. (BAUMAN, 2005,p.44)

O idêntico não se define pela negação da diferença assim como a diferença não se define pela negação do idêntico; há ai dois conceitos que se implicam e que são a definição fundamental do pensamento. Contudo, deve-se notar que o idêntico é privilegiado em relação à diferença: a diferença pura é impensável. (L. Boisse) Talvez se devesse dizer o mesmo da identidade pura (...) (LALANDE, 1999, p.505)

O mesmo e o igual não se recobrem, tanto quanto o mesmo e a uniformidade vazia do puro idêntico. O igual sempre se liga ao sem-diferença, a fim de que tudo se ajuste nele. O mesmo, ao contrário, é o pertencimento mútuo do diferente a partir da reunião operada pela diferença. Só se pode dizer o mesmo quando a diferença é pensada[...] O mesmo descarta todo desvelo em resolver as diferenças no igual: sempre igualar e nada mais. O mesmo reúne o diferente numa união original. O igual, ao contrário, dispersa na unidade insípida do uno simplesmente uniforme (HEIDEGGER, 2206, p. 231).

[...] o NÃO heideggeriano remetia, não ao negativo no ser, mas ao ser como diferença; e não a negação, mas a questão [...] As teses de Heidegger podem ser assim resumidas: 1ª., o não não exprime o negativo, mas a diferença entre o ser e o ente [...]; 2ª., esta diferença não é ‘’entre...’’, no sentido ordinário da palavra. Ela é a dobra. Ela é constitutiva do ser e da maneira pela qual o ser constitui o ente no duplo movimento da ‘’clareira’’ e do ‘’velamento’’. O ser é verdadeiramente o diferenciador da diferença. Daí a expressão; diferença ontológica [...] a diferença ontológica está em correspondência com a questão. Ela é o ser da questão que se desenvolve em problemas, balizando campos determinados em relação ao ente [...], assim compreendida, a diferença não é objeto de representação. A representação, como elemento da metafísica, subordina a diferença à identidade, relacionando-a a um tertium como centro de uma comparação entre dois termos julgados diferentes (o ser e o ente) [...] Não há síntese, mediação nem reconciliação na diferença, mas, ao contrário, uma obstinação na diferenciação. É esta a ‘’virada’’, para além da metafísica [...], portanto, a diferença não se deixa subordinar ao Idêntico ou ao Igual, mas deve ser pensada no Mesmo e como o Mesmo (DELEUZE, 2006, p.104).

‘’a identidade na forma do conceito indeterminado, a analogia na relação entre conceitos determináveis últimos, a oposição na relação das determinações no interior do conceito, a semelhança no objeto determinado do próprio conceito’’. (DELEUZE, 2006, p.57).

‘’A abertura pertence essencialmente a univocidade. As distribuições sedentárias da analogia opõem-se as distribuições nômades ou as anarquias coroadas no unívoco. Somente aí ressoam ‘’Tudo é igual!’’ e ‘’Tudo retorna’’ Mas o Tudo é igual e o Tudo retorna só podem ser ditos onde a extrema ponta da diferença é atingida. Uma mesma voz para todo o múltiplo de mil vias, um mesmo Oceano para todas as gotas, um só clamor do Ser para todos os entes. Mas à condição de ter atingindo, para cada ente, para cada gota e em cada via, o estado de excesso, isto é, a diferença que os desloca e os disfarça, e o faz retornar, girando sobre sua ponta móvel’’ (DELEUZE, 2006, p.417).

La ciudad contemporánea podría asimilarse a un cuerpo sin órganos que realizara sus funciones, no mediante la coordinación de elementos especializados, como defendia La Carta de Atenas, sino gracias a procesos de inspiración, evaporación y transmisión de fluidos, procesos que están en permanente actividad y evolución. La tendencia funcional de La ciudad tardocapitalista apunta en esta dirección, hacia La mezcla de formas y funciones em uma amalgama urbana indiferenciada. (Vazquez,2004, p. 131)

Ou ainda,

A questão geral dos processos da natureza e dos assentamentos humanos não é propriamente de Organização no universo macro, mas, de Composição de movimentos velozes ou retardados do universo micro (molecular), o qual pressupõe Multiplicidade de agenciamentos enquanto passagem de fluxos, intensidades, composição de micro poderes, e isso, numa formação social no universo de uma micro política. Pois, as cidades comportam coexistências dinâmicas dessa multiplicidade e constroem complexas redes de conexões de elementos heterogêneos em permanente transformação e onde emergem Acontecimentos de imprevisíveis destinos caracterizados por sobreposições, misturas, zonas de vizinhança, contaminações, temporalidades diferentes, entre outras modalidades de processos de composição, e isso, no sentido dinâmico de uma Totalidade segmentaria. (Magnavita, 2008)

‘’(...) idade em que a noção de cultura se expandiu a ponto de abarcar praticamente todas as dimensões da vida social. Não há experiência ou artefato que não se apresente investido de um significado cultural qualquer, que por isso mesmo passa por instância definidora de sua natureza. Tudo é passível de associações simbólicas, possui referencias práticas e tradições locais – valores esquecidos e reativados por essa nova voga cultural, que parece querer a todo custo devolver aos cidadãos cada vez mais diminuídos nos seus direitos, materialmente aviltados e socialmente divididos, sua ‘’identidade’’, mediante o reconhecimento de suas diferenças’’ (ARANTES, 1998, pág. 152).

Enfim, o fundo do poço da vergonha foi atingido quando a informática, o marketing, o desing, a publicidade, todas as disciplinas da comunicação apoderaram-se da própria palavra conceito e disseram: é nosso negócio, somos nós os criativos, nós somos os conceituadores! Somos nós os amigos do conceito, nós os colocamos em computadores. Informação e criatividade, conceito e empresa: uma abundante bibliografia já... O marketing reteve a idéia de uma certa relação entre conceito e o acontecimento; mas eis que o conceito tornou o conjunto das apresentações de um produto (histórico, científico, artístico, sexual, pragmático...), e o acontecimento, a exposição que põe em cena apresentações diversas e a “troca de idéias” à qual supostamente dá lugar. (Deleuze, 2005 [1992], pp. 25)

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